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Programa de Parcerias de Investimentos – PPI do governo Temer: retórica ou desburocratização?

O atual governo interino emitiu a Medida Provisória nº 727/2016 visando criar um programa de parcerias de investimentos denominado PPI. Esse programa basicamente se depreende em dois eixos: ressuscitar o programa de desestatização e trazer à tona uma nova rodada de projetos de Parceria Público Privadas.

Primeiro vamos nos debruçar sobre a questão da desestatização. Nesse sentido temos, visivelmente, mais uma carta de interesses do que qualquer iniciativa efetivamente relevante nesse sentido. Nela se faz menção ao defunto programa de desestatização e centraliza-se o conselho deste programa dentro do Conselho do PPI; além disso, se afirma que as escolhas públicas a serem tomadas deste ponto em diante serão efetivamente embasadas no intento de se efetuar medidas de desestatização.

Qualquer medida real que vise diminuir o estado ou desburocratizar de fato a sociedade brasileira fica condicionada a decretos a serem emitidos futuramente.

Nesse ponto devemos ser realistas e céticos: ainda que tenha havido uma centralização de algumas atribuições, não temos de fato nada a não ser promessas de um sistema que vise agilizar o funcionamento do estado. Não há sequer um planejamento real que determine os setores em que essa mudança de paradigma seria colocada como prioridade. De fato, abre-se a possibilidade de criação de convênios entre secretarias e outros órgãos e entes da administração direta e indireta, mas tais atos são fundamentalmente limitados pela vontade política em exercício naquele momento.

Se tal instituto visava criar uma agilidade, acaba mais por ser exemplo do paquidérmico estatal brasileiro, vide que seu artigo 6º, inciso II e III põe:

“II – análise de impacto regulatório quando da edição ou alteração de regulamentos, planos regulatórios setoriais e outros atos regulatórios setoriais, visando a orientar a tomada das decisões e assegurar a eficiência, a eficácia, a coerência e a qualidade da política regulatória, com integral respeito às normas e direitos envolvidos; III – oitiva prévia das autoridades competentes quanto à consistência e aos impactos fiscais, econômicos e concorrenciais de medidas de regulação em estudo;”

Uma análise lógica sobre o tema nos leva a crer que: a) nunca se analisa as externalidades dos atos governamentais antes de sua edição, e b) tal análise era até ontem irrelevante ao governo. Ainda que a realidade que se defronta nos leve a crer que seja mesmo este o caso, acaba-se por passar o recibo no que tange a incompetência estatal.

De toda sorte, no quesito posto, estamos frente a uma situação onde cabe esperar a regulação para ver é retórica ou se há de fato interesse em se efetuar alguma mudança nesse sentido, mas não escapa ao autor a ironia da necessidade de se aguardar um decreto para se observar o real intento de desburocratizar o estado.

Quanto à ideia de trazer uma nova rodada de PPP’s, temos ao menos algumas iniciativas interessantes. Cabe aqui um parêntese entre a prática e a teoria de um contrato administrativo. Na teoria, pela lei nº 8.666/1993 e suas correlatas, antes de haver uma licitação deve ser feita a elaboração dos documentos de projeto básico e projeto executivo antes de iniciar a licitação para execução do projeto em si. Teoricamente estes elementos de projeto seguiriam as boas técnicas sendo sujeitos às normas da ABNT, o que teoricamente seria suficiente. Teoricamente!

Na prática o que se vê são projetos executivos de túneis com mais de 500 metros de extensão com apenas dois furos de sondagem e sequer no eixo do túnel e ausência de pesquisas estratigráficas em escala compatível a área, tornando a previsão do projeto algo mais próximo de um augúrio do que efetivamente de um feito cabível à engenharia. Isto somente na área de infraestrutura. A verdade é que para se efetuar um projeto dentro das boas práticas existe um custo grande e pouco justificável perante órgãos como Tribunais de Contas e similares. É fundamentalmente um problema de cisne negro, exigir um estudo mais aprofundado que só é justificável se encontrado algo que é inesperado, se não encontrarmos o que aparenta-se como um desperdício.

O problema é que se licita projetos com pouca segurança e isso acaba por refletir no preço. Dessa forma, aqueles que executam as obras, cientes disso, embutem no preço da empreitada a incerteza gerada pela pouca informação: se ocorrer um problema o executor está garantido e, se não ocorrer, maior o lucro.

Boa parte dos aditivos aos contratos ocorrem justamente por isso. Uma ocorrência geológica não investigada pode gerar custos exponenciais em uma obra, isso observando somente um dos aspectos que o estudo de um projeto deve ter. Se formos listar todos os possíveis custos que podem vir a ocorrer e usualmente não são contabilizados por serem de aferição custosa ficaremos com um texto ainda mais longo.

Justamente aí a nova Medida Provisória traz alguns pontos que vale a pena analisar.

Primeiro, abre a possibilidade de terceiros intervirem trazendo novos dados para subsidiar as características básicas de um empreendimento. Na amplitude de produção de informação moderna, restringir a uma meia dúzia o processo de catalogação de dados é de uma estupidez medieval.

Segundo, cria um processo lógico onde se integra os estudos relacionados não só à execução do projeto em si como à regulação a que inevitavelmente se submeterá. É um mea culpa, afinal, uma obra pública que não tem seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA) aprovado só pode ocorrer numa burocracia onde a mão direita não sabe o que a esquerda faz. Criar um grupo para adequar essa questão é razoável, mas bem verdade, o melhor seria que os órgãos reguladores fossem parte do processo de elaboração do projeto, afinal, se é competente para fiscalizar, também o é para fazer. Jogar a responsabilidade para o setor privado é fundamentalmente criar dificuldade para vender facilidade.

Terceiro, cria um fundo ligado ao BNDES de apoio à estruturação de parcerias para financiar os estudos globais previstos anteriormente. Segundo a Medida Provisória esse fundo seria formado por cotistas que podem ser estatais ou privados, além de organismos internacionais. Só que o fundo veda o pagamento de rendimento aos cotistas, obriga a remunerar o BNDES pela administração e gestão e, ainda por cima, veda a liquidação das cotas se não houver recursos livres equivalentes à liquidação. Ou seja, fica complicado entender quem consideraria tal empreitada interessante. Afinal, estamos falando de um fundo que só poderá ter cotas valorizadas com base nos pagamentos pelos projetos de integração contratados com o governo, sujeitos às regras de atraso de 180 dias sem incorrer em inadimplência, pagamento de inadimplemento por via judicial por precatório e similares. Ou seja: se o governo achar quem queira, podemos vender a Torre de Londres ou Versalhes a ele.

De toda sorte, o que se pode concluir é que de material há pouco nessa Medida Provisória. Vejamos se com o tempo aparecerá algo de real a ser analisado.

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