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Como a proibição das drogas aumenta a procura por remédios nos pronto-socorros

Todo dia vejo pessoas durante os piores momentos de suas vidas. Como um médico de emergência, vejo as vítimas de violência, doenças e idade no seus momentos mais vulneráveis. Durante um dos meus plantões, uma menina de nove anos de idade, Nancy, entrou no pronto socorro com um braço quebrado em um ângulo de 90 graus. Naquela mesma noite, um paciente em busca de drogas, Richard, veio ao hospital pela quinta vez no mês com uma desculpa inventada.

Enquanto trabalhava nas falsas doenças de Richard, era incapaz de aliviar a dor excruciante de Nancy. Ela sofreu com pouco mais de um bicho de pelúcia para confortá-la porque Richard precisava de sua medicação.

Em um ambiente de medicamentos controlados, pacientes como Richard não são raros. Mas não é o grande número de dependentes químicos num pronto socorro o problema, mas sim as doenças inventadas pelos dependentes como Richard. Eles tendem a inventar sintomas para doenças graves que oferecem uma passagem rápida pelo pronto socorro para aumentarem as chances de receberem medicamentos intravenosos.

Infelizmente, essas queixas exigem recursos que poderiam ser destinados a outras pessoas como Nancy. Pior ainda, os viciados repetem o truque. Um dos meus pacientes em busca de medicamento fez 183 visitas ao meu departamento de emergência em um ano e visitou pelo menos dois outros pronto socorros. Baseado na minha experiência, estimo que a busca por medicamento controlado é responsável por 20% a 30% de todas as visitas aos pronto socorros.

Enquanto isso, atendimentos de emergência com prescrição de medicamentos aumentaram pelo menos 75% para todos os grupos etários entre 2004 e 2009. Salas de emergências prescreveram 49% mais analgésicos em 2010 do que em 2001. As receitas de analgésicos por queixas dentárias aumentaram 26% entre 1997 e 2007.

Um estudo descobriu que um grupo de pacientes em busca de medicamentos procura uma média de doze atendimentos de emergência por ano. Usando pseudônimos, os viciados visitam vários hospitais. Outro estudo constatou que a situação é pior ainda, com os viciados visitando a emergência, em média, 14 vezes ao ano, enquanto pacientes normais possuem uma média de duas visitas ao ano.

Nas conversas entre os profissionais de saúde há um tópico recorrente: a busca desenfreada por medicamentos no pronto socorro. Eles discutem em fóruns, dedicam numerosos posts sobre o assunto, fazem até mesmo algumas brincadeiras. Profissionais de saúde como médicos e enfermeiros relataram momentos violentos por parte de viciados que tiveram medicamentos negados.

Muitos médicos e enfermeiros estão tão frustrados que preferem correr o risco de tratamento alternativo sem analgésicos para pacientes normais do que serem procurados por viciados novamente. Isto é um vergonha. Alguns profissionais de saúde chegam a acreditar que os pacientes com queixas de dor verdadeiras são a minoria.

Para aliviar os efeitos colaterais da procura de medicamento controlado, um médico escreveu um artigo sobre como obter medicamentos de forma rápida e sem irritar a equipe. Gestores de saúde tomaram medidas para combater a procura de drogas nos pronto-socorros como arquivos de “paciente habitual” ou sistemas de computador para acompanhar e identificar os pacientes suspeitos. Outros hospitais têm aumentado a educação médica para ajudar a identificar viciados em drogas.

A busca dos viciados por medicamentos chamou a atenção dos legisladores. Nos EUA, cada estado tem um programa de monitoramento de drogas de prescrição para ajudar médicos e enfermeiros a determinar se um paciente precisa ou não de medicamento. Alguns estados têm interligado esses bancos de dados para limitar o “turismo do analgésico.” Vários estados proíbem que médicos façam receitas com vários medicamentos, o que facilita a obtenção dos mesmos.

O sinal mais revelador desse importante problema social são as políticas contraditórias destinadas a resolvê-lo. Embora o Órgão de Combate às Drogas (DEA) ameace com a perda da licença de prescrição os pronto socorros com excesso de prescrições, outros organismos ameaçam funcionários de hospitais com represálias caso eles prescrevam inadequadamente.

Esta preocupação com a busca por medicamentos nos pronto-socorros é resultado dos problemas consideráveis ​​que tal busca cria, como o aumento nos tempos de espera e desperdício de recursos. Isso prejudica a saúde de quem realmente precisa de cuidados hospitalares – ou seja, de todos uma vez ou outra. E como a proibição incentiva viciados a procurarem o sistema de saúde ao invés de oferecer medicamentos seguros e baratos, a lei afeta os viciados também.

Eu não culpo Richard. Com as drogas proibidas, ele tem dois lugares para obter drogas: por meio de médicos ou nas ruas. Alguns se surpreendem que pessoas como Richard preferem hospitais com seus obstáculos burocráticos, seguranças e outros aborrecimentos. Mas nas ruas, tais pessoas enfrentam a violência, possibilidade de prisão, perda de emprego e drogas caras e impuras.

Se houvesse uma terceira opção – comprar drogas legalmente – os candidatos a receber medicamentos teriam uma nova equação. Sob novos incentivos, alguns (provavelmente a maioria) dos candidatos aos medicamentos nos pronto-socorros iriam preferir drogas legais de lojas ao invés de pronto socorros, clínicas burocráticas e revendedores em becos. E estes candidatos a medicamentos iriam desaparecer, assim como todos os seus problemas.

Apoiar o fim da guerra às drogas é defender que os pronto-socorros ajudem os pacientes que realmente necessitam de atenção – como Nancy, sua família ou você mesmo.

Tradução: Rafael Cury; Revisão: Marcelo Faria

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