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A economia da Venezuela tem solução. E, ironicamente, ela está nos Estados Unidos

A Venezuela está se aproximando perigosamente da hiperinflação. No fim do ano de 2015, os números oficiais indicavam um nível de inflação anual de 180% ou mais (uma análise do setor privado estimou um nível de 330%). A definição técnica de hiperinflação é quando a inflação se encontra a 50% ou mais por mês, o que significa que a Venezuela ainda não chegou a esse ponto, mas aparenta estar se aproximando dele a um ritmo acelerado. O país sul-americano se encontra com as piores taxas de inflação de sua história (em 1996 teve 103% de inflação ao ano). E a mais alta do mundo (a Ucrânia está em segundo lugar, com 50% de inflação anual).

Gráfico 1. Taxa de inflação oficial da Venezuela.

Venezuela - Gráfico 1
Fontes: Instituto Nacional de Estatística da Venezuela

Os principais efeitos da hiperinflação começam a ser sentidos. Em todos os casos de hiperinflação da história, a principal causa foi o desequilíbrio fiscal, e o caso da Venezuela não é exceção. Quando o déficit dispara, o mesmo acontece com a inflação (gráfico 2).

Gráfico 2. Déficit orçamentário (vermelho) e inflação (azul). 

Déficit orçamentário e inflação. Fonte: Banco Central da Venezuela; Fundo Monetário Internacional
Fontes: Banco Central da Venezuela e Fundo Monetário Internacional

Normalmente, a inflação segue o déficit fiscal com um atraso relativamente grande, pois os agentes econômicos não têm como antecipar os valores e a monetização do déficit com precisão. Por outro lado, em tempos de hiperinflação, a inflação antecipa o déficit (os agentes econômicos superestimam as novas políticas de monetização e há uma tendência universal a evitar a moeda local). Na Venezuela, podemos ver que desde 2013 (gráfico 3) a inflação cresceu num ritmo mais acelerado que o déficit e por essa razão podemos considerar que o país se encontra a caminho da hiperinflação desde então.

Gráfico 3. Ritmo de mudança na inflação (azul) e no déficit orçamentário (vermelho). 

Ritmo de mudança na inflação (azul) e no déficit orçamentário (vermelho). Fonte: Gráfico original baseado em dados do Banco Central Venezuelano; Fundo Monetário Internacional
Fontes: Banco Central Venezuelano e Fundo Monetário Internacional

Isso cria um grande problema para o governo da Venezuela porque a taxa de arrecadação real cai (assim como em todos os casos de hiperinflação). Entre o recebimento das receitas fiscais e o emprego delas, a inflação corrói o valor real, dando ao governo um valor reduzido da arrecadação real.

Há uma relação inversa entre a inflação na Venezuela e os preços do petróleo bruto (gráfico 4). Esta relação é tal que a inflação cresce rapidamente quando a principal fonte de arrecadação do governo (receita do petróleo) cai devido ao fato de que o governo faz muito pouco para reduzir os custos quando se tem queda nas receitas (assim, os déficits são monetizados e o valor da moeda cresce a taxas agressivas).

Gráfico 4. Preço do petróleo (vermelho) e inflação (azul).

Preço do petróleo (vermelho) e inflação (azul). Fonte: Instituto Nacional de Estatística República Bolivariana da Venezuela, OPEP
Fonte: Instituto Nacional de Estatística da Venezuela, OPEP

Um dos aspectos mais surpreendentes e paradoxais da hiperinflação é a escassez de dinheiro. Quando o aumento dos preços fica fora de controle (o que começa a acontecer na Venezuela), as novas emissões de dinheiro não são suficientes para responder ao aumento dos preços. Em outras palavras, a oferta monetária real cai (oferta monetária nominal / níveis de preço). Vemos a mesma coisa acontecendo na Venezuela apesar dos enormes níveis de criação monetária: a escassez monetária se torna cada vez mais comum (gráfico 5). Enquanto a oferta monetária dobrou desde o ano passado, a oferta monetária real caiu em 30%.

Gráfico 5. Crescimento da oferta monetária nominal (azul) e real (vermelho).

Crescimento da oferta monetária nominal (azul) e real (vermelho).

O último estágio em todos os casos de hiperinflação é a estabilização monetária. Esse estágio é inevitável, seja devido às mudanças introduzidas pelo governo ou à completa rejeição da moeda local pela população. Para que tal reforma monetária tenha êxito é fundamental que o governo primeiro elimine o déficit orçamentário. Infelizmente, ao que parece, o governo venezuelano não tem qualquer plano de corte de gastos, tampouco parece que a receita do petróleo irá se recuperar num futuro próximo, o que significa que qualquer tentativa de estabilização monetária certamente fracassará (assim como ocorreu da última vez quando se introduziu o bolívar forte em 2008).

À luz dessa situação, parece que a Lei de Thiers é inevitável. A Lei de Thiers é o inverso da Lei de Gresham. Uma moeda de boa qualidade toma o lugar de uma de má qualidade, tirando-a de circulação, à medida que esta é abandonada. Atualmente, o dólar americano é usado pelos venezuelanos como reserva de valor e, em menor escala, unidade de conta. A única função que o bolívar forte desempenha é a de meio de pagamento, e é uma questão de tempo até que perca também essa função (de fato, já começaram a surgir alternativas ao uso da moeda local em forma de escambo e comércio). Como o dólar americano já atende a várias funções que substituem a moeda venezuelana, é muito possível que ele venha a se tornar o sucessor indesejado do bolívar.

É quase certo que a Venezuela terá hiperinflação, para a qual só há duas soluções: redução drástica dos gastos e do déficit, e implementação de uma reforma monetária ou adoção do dólar. Ambos são igualmente impopulares para o governo da Venezuela, mas a diferença é que a primeira opção (o déficit) segue negligenciada e o segundo (dolarização) é inevitável.

Ou seja: um dos governos mais antiamericanos do mundo terá que aceitar o dólar americano como único remédio contra a hiperinflação.

Tradução: Igor Saito. Revisão: Marcelo Faria

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