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O histórico brasileiro de tentativas de instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF)

O artigo 153, inciso VII, da Constituição Federal estabelece a possibilidade da União Federal instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas (“IGF”), mediante a edição de uma lei complementar pelo Congresso Nacional. Trata-se de uma inovação da Constituição de 1988 – não existente nas outras constituições brasileiras – que absorveu a tendência de tributos semelhantes existentes na Europa, tais como os impostos sobre fortunas da França (os revogados Impôt sur lês Grandes Fortunes e Impôt de Solidarité sur La Fortune).

A Constituição Federal prevê a competência da União Federal de criar tal imposto sobre grandes patrimônios, mas o exercício efetivo deste poder de tributar depende da edição de uma lei complementar, razão pela qual o brasileiro ainda não é incomodado com mais um tributo que comprometeria o direito de propriedade e a liberdade do cidadão.

Inicialmente, deve-se ponderar sobre as dificuldades semânticas e práticas de dimensionar a “fortuna”, uma vez que o país apresenta notórias desigualdades sociais, dado o intervencionismo histórico do estado sobre a economia e os impedimentos burocráticos à prosperidade negocial. Além disso, o Brasil apresenta um alto fluxo de riquezas decorrentes da exploração da terra e um baixo nível de especulação financeira e exploração de bens imateriais. Em seguida, um novo desafio deverá ser superado: dimensionar o que seria uma “grande fortuna”.

A possível repulsa social e as dificuldades políticas da criação desse imposto foram reconhecidas pelo constituinte, na medida em que este determinou expressamente que o imposto sobre grandes fortunas pode ser instituído mediante a edição de uma lei complementar. Vale lembrar que a “lei complementar” se diferencia da lei comum (ou “lei ordinária”), pois para a aprovação deste instrumento legal é necessária a maioria absoluta na votação pelo legislativo, enquanto as leis comuns demandam a maioria simples. Além disso, as matérias de trato exclusivo por via da lei complementar não podem ser objeto de edição por meio de Medidas Provisórias (conforme o artigo 62 da Constituição Federal).

O histórico brasileiro de tentativas de instituir o IGF se origina com o Projeto de Lei Complementar nº 162/1989 proposto pelo então Senador Fernando Henrique Cardoso. O projeto não prosperou e por mais de uma década as discussões acerca desse imposto ficaram restritas aos meios acadêmicos, considerando que o Brasil precisou superar inúmeros entraves econômicos para adquirir certa estabilidade nesse período.

No ano de 2008, a Senadora Serys Slhessarenko propôs o Projeto de Lei Complementar nº 50/2008 versando sobre a instituição do imposto sobre grandes fortunas. No mesmo sentido, caminhou as proposituras do Projeto de Lei Complementar nº 100/2008 do Senador José Nery e o Projeto de Lei Complementar nº 128/2008 do Senador Paulo Paim. Esses três projetos foram arquivados no Senado Federal.

O senador Antonio Carlos Valadares propôs em 2011 o Projeto de Lei Complementar 534 que estabelecia a incidência do IGF sobre o patrimônio (“conjunto de bens e direitos de qualquer natureza” no texto do projeto) a partir de 2,5 milhões de reais, ressalvados o imóvel residencial de até 1 milhão de reais e os bens e equipamentos de produção em trabalho autônomo de até 1,5 milhão de reais. Propunha ainda uma tabela progressiva do IGF, com alíquotas variando entre 0,5% e 2,5% de acordo com o patrimônio (a alíquota de 2,5% incidiria sobre o patrimônio superior a 40 milhões de reais). O projeto está nas gavetas do Senado Federal.

A iniciativa mais recente de instituir o imposto sobre grandes fortunas decorre do Projeto de Lei Complementar nº 315/2015 de nova autoria do Senador Paulo Paim (PT do Rio Grande do Sul), o qual incidiria sobre o patrimônio das pessoas físicas de valor superior a 50 milhões de reais, excluídos os imóveis residenciais e os bens de produção de qualquer valor, os bens de consumo não alienáveis e os bens guardados pela cláusula de inalienabilidade. A alíquota incidente seria de 1% e a proposta comporta a possibilidade de alguns abatimentos na base de cálculo, tais como os tributos incidentes sobre o patrimônio (IPVA, IPTU, ITR, ITCMD e ITBI). Esse projeto de lei está atualmente na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal.

O fato é que em nenhuma dessas tentativas de criar o IGF no Brasil foi apresentado um estudo preliminar sobre os impactos econômicos decorrentes da instituição desse novo imposto, demonstrando, assim, o nível especulativo e ideológico dos projetos. Os valores de base de cálculo dos projetos não são construídos a partir de dados objetivos. Aliás, considerando a análise comparativa, ainda é desconhecido pela academia qualquer estudo sério sobre um estado que tenha instituído um tributo semelhante e que tenha concomitantemente incrementado as receitas e preservado o investimento nos seus limites territoriais.

É praticamente impossível conceber que a instituição de um imposto sobre grandes fortunas no Brasil poderia incrementar as receitas do estado sem implicar na fuga de investidores e no abalo das expectativas da indústria e comércio. Aqueles que afirmam, com base nos números internacionais (considerando recente estudo publicado da OCDE), que o Brasil tributa pouco a renda e o patrimônio, simplesmente desconsideram o número de tributos existentes no país, a elevada carga tributária sobre a produção e o consumo, o número de horas investidas no cumprimento de obrigações tributárias instrumentais e o nível de intervenção estatal no desenvolvimento dos negócios. A análise deveria considerar todos os tributos existentes e todas as limitações impostas pelos governantes.

O imposto sobre grandes fortunas, portanto, representa mais uma forma de intervenção na liberdade e na propriedade daqueles que detêm maior potencial de investimento, determina um contexto de incentivo à alocação de capital em outros países com tributos menores e em nada colabora com um projeto de reconstrução econômica. Os defensores do IGF também desconsideram os postulados que convergiram para a determinação do modelo teórico da curva de Laffer. Tais defensores acabam por fomentar a ânsia arrecadatória fiscal e a ausência do crescimento pelo mecanismo da concorrência e do ambiente livre para a realização de negócios.

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