“Quem vota e como vota não conta nada; quem conta os votos é que realmente importa.”. Como queria Stalin, em 23 de maio, a organização da Assembleia Geral de Alunos da UFSCar já estava feita, a mesa diretora contava apenas com pessoas favoráveis à greve, o modo de votação era totalmente fraudável e os discursos estavam afinados. Já haviam denunciado anteriormente o modus operandi da assembleia, que de democrática, não tinha nada.
A primeira amostra antidemocrática se deu nas regras. Até a manhã do dia da assembleia, não se tinha conhecimento de nada, do modo de votação, da mesa diretora, da pauta definida, e o mais grave, não tinha nem hora pra começar a votação. Assim que publicaram as regras, houve muito debate no grupo da universidade da mídia social. Havia muita coisa indefinida, mas o que mais causou revolta foi como seria feita a contagem de votos: contraste visual.
Antes de a assembleia começar, outra regra que incomodou muitos, a obrigatoriedade de se estar em uma assembleia com horário de início e sem um horário limite para a votação. Como ter uma democracia em que alunos que usam ônibus, ou bicicleta, ou até aqueles que trabalham durante a noite ou que tem que acordar muito cedo de manhã, como poderiam votar em algo do seu interesse? Como sempre, seguindo a jurisprudência dessa galera “democrática”, a votação iniciou depois das 23h, um horário em que os estudantes que usam o transporte público já foram embora.
No começo da assembleia, o ginásio foi tomado, muitas pessoas que chegaram um pouco depois, não conseguiram entrar e votar as duas primeiras decisões. Se o voto seria por contraste visual e se pessoas alheias à universidade poderiam votar, qual a razão de uma pessoa que não é aluna da universidade votar em uma Assembleia de alunos? O palco estava armado. Depois dessa decisão, por falta de espaço, a assembleia mudou para o gramado, onde todos poderiam participar, mas as decisões já proferidas não seriam votadas novamente. Muitos desistiram de continuar naquela “patacoada”, como relatado, e foram embora. Há relatos de que tinham muitas pessoas de outras universidades, muitas pessoas que não eram sequer alunos. Houve o flagrante de um carro do sindicato dos metalúrgicos estacionado ao lado do ginásio. Enfim, houveram propostas para votação pelo sistema AVA (Sistema interno da universidade), que filtraria apenas aqueles que são alunos através do registro do aluno (RA) e da senha, mas essa proposta foi vencida na votação por contraste visual.
Depois de horas e horas de debates, conversas, votações e muitos delírios da frente ideológica, que ainda não sabe que o país está quebrado (ou até sabem e preferem que haja calote para “prejudicar” os banqueiros), a votação principal seria para decidir entre duas opções: 1) paralisação ou greve e 2) nada. Houve defensores da greve, da paralisação, mas segundo relatos, não houve abertura para alguma defesa da opção “nada”. Essa votação aconteceu em horário avançado, depois de muitas desistências por causa do frio, por causa dos discursos que não levavam a lugar algum, por causa do transporte ou simplesmente por não aguentar mais tanto debate sem sentido.
Pessoas com opiniões contrárias tiveram um pouco de dificuldade de se organizar, apesar de contar com um abaixo assinado para usar a justiça contra a paralisação, não conseguiram estimular muitas pessoas a comparecerem na assembleia, e estando lá, se negaram a jogar o jogo (sujo) do adversário. Nesse momento em que o país está passando uma grave crise, em que uma oposição de fato está renascendo, muitos ainda precisam de certa maturidade política e discernimento para saber quais lutas aceitar e quais campos de batalha atuar, papel que a situação sabe fazer muito bem.
A democracia muitas vezes é utilizada para a ditadura da maioria, ainda mais quando a falta de regras é evidente. As votações para a criação de regras preliminares da assembleia é a prova disso. O uso do voto ilegítimo para legitimar seu próprio voto é uma contradição tremenda, que foi ignorada do inicio ao fim da assembleia. A utilização de meios legais para buscar valer-se de seus direitos também faz parte da democracia, e é um dos controles constitucionais. Na guerra entre direitos coletivos e direitos individuais sempre deve prevalecer este último, e a liberdade de escolher individualmente se adere ou não à greve é a forma mais justa possível, ninguém deve ser subjugado por outrem, pois abre precedentes para o autoritarismo e ditadura, mesmo que seja uma ditadura disfarçada de democracia.